A atuação do diretor escolar é o segundo fator, dentre os controlados pela política educacional, de maior impacto na aprendizagem dos estudantes, atrás apenas da prática pedagógica dos professores. Essas lideranças escolares cumprem um papel central na concretização da gestão democrática, a garantia de um bom clima escolar e a promoção de um ambiente de aprendizado e formação constante. No entanto, existe no Brasil grande heterogeneidade em relação às formas de seleção e de formação de diretores entre municípios e estados, o que impacta diretamente na qualidade da gestão escolar. O relatório de política educacional “Seleção e Formação de Diretores: mapeamento de práticas em Estados e capitais brasileiros” tem como propósito apresentar uma análise dessas duas questões.
Elaborado pelo Dados para um Debate Democrático na Educação (D³e), com apoio da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) e do Todos Pela Educação (TPE), o documento apresenta uma análise sobre como ocorre a seleção e a formação dos diretores nos estados e nas capitais do Brasil e aponta recomendações para aprimorar políticas públicas na área.
Para desenvolver o estudo, os pesquisadores fizeram inicialmente um levantamento das características dos diretores escolares com base nos dados oficiais do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) 2019 e do Censo Escolar 2020, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Em uma segunda etapa foi feito um amplo levantamento de dados junto às secretarias de Educação estaduais e de capitais brasileiras durante o primeiro semestre de 2022. O questionário foi aplicado por auditores cedidos pelos Tribunais de Contas estaduais e municipais.
A análise de dados secundários brasileiros aponta que a função é exercida majoritariamente por mulheres (80,6% do total), mais de 70% têm acima de 40 anos e cerca de 40% se identificam como brancos. Por outro lado, apenas um terço se reconhece como de cor/raça preta, parda ou indígena, percentual bem abaixo da distribuição populacional desses grupos no país. Cerca de 80% dos gestores atuam em uma única escola, e os outros 20% se dividem entre duas ou mais instituições – fato que pode afetar a qualidade do trabalho desenvolvido. Por fim, outro ponto a ser ressaltado é que os dirigentes acumulam experiência em sala de aula: quase 90% informaram ter mais de cinco anos de trajetória como professor.
Já o levantamento de dados primários apontou que na maioria dos estados há mais de uma modalidade compondo a forma de seleção principal, sendo as mais frequentes a eleição (56%), seguida de indicação pela gestão (48%), apresentação de plano de gestão (33%) e certificação (30%). Nas capitais é menos comum a existência de múltiplas modalidades e a eleição se mantém como a modalidade mais presente (62%), seguida por certificação e plano de gestão (38%) e, por fim, indicação (35%). Em relação à formação, cerca de 30% das secretarias de Educação de estados e municípios responderam que é necessário ter curso de gestão escolar para se candidatar ao cargo de direção. A maioria das redes afirma oferecer formação continuada aos diretores escolares e as metodologias mais frequentes adotadas são aulas expositivas, sendo as secretarias de Educação as principais responsáveis pela oferta desses cursos.
O estudo também identificou algumas tendências recentes, como a alteração nas formas de seleção em 75% dos estados analisados e uma crescente judicialização dos processos de eleição, com a decisão do Supremo Tribunal Federal de inconstitucionalidade da modalidade (ADI 2997), uma vez que cargos públicos só podem ser providos por meio de concurso público ou nomeação. Entre as recomendações apresentadas pelos autores da pesquisa estão o avanço na definição das responsabilidades da União, dos estados e municípios e no regime de colaboração no que se refere à gestão escolar, no âmbito do Sistema Nacional de Educação, bem como a criação de um marco nacional para gestão escolar, que guie as redes públicas estaduais e municipais, o que também merece a atenção dos Tribunais de Contas brasileiros.
Em relação à seleção de diretores, os pesquisadores sugerem a adoção de critérios técnicos combinados a processos democráticos e a realização de processos seletivos mistos, combinando mais de uma etapa de seleção. No âmbito da formação é interessante garantir oportunidades de formação e desenvolvimento aos professores que querem se tornar diretores ou para aqueles que já atuam na gestão. E, por fim, recomenda-se criar formas para promover a equidade, adotando políticas que garantam mais recursos e apoio para gestores de escolas que enfrentam mais desafios.
Esperamos que todas as evidências contidas neste estudo colaborem para qualificar o debate sobre gestão educacional e possibilitem mudanças evolutivas e significativas na forma de seleção e formação de diretores escolares, promovendo, enfim, uma educação de qualidade aos estudantes de todo o Brasil.
Cezar Miola é presidente da Atricon; Ivan Gontijo é gerente de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação; e Antonio Bresolin é diretor executivo do Dados para um Debate Democrático na Educação (D³e)
*Artigo publicado no Blog do Fausto Macedo, no Estadão.