TCU vai ouvir empreiteiras e dirigentes da Petrobras envolvidos na Operação Lava Jato

Ações judiciais não afastam a obrigação do TCU de apurar os fatos e aplicar sanções relativas à sua jurisdição

empreiteiras (2)Conluio entre as empresas, fraude às licitações e viabilização da atuação de cartel mediante o recebimento de propina. Diante dessas irregularidades, verificadas no âmbito da “Operação Lava Jato”, o Tribunal de Contas da União (TCU) vai ouvir as empresas e dirigentes à época da Petrobras para eventual aplicação das penalidades de competência do TCU.

Nesse trabalho foram avaliados cinco contratos da Petrobras para obras, serviços e equipamentos voltados à implantação da Refinaria Abreu e Lima em Pernambuco, também chamada de Refinaria do Nordeste (Rnest). Os contratos totalizavam R$24,7 bilhões, ou 54,6% dos termos firmados para implantação da Refinaria. Segundo o ministro Benjamin Zymler, relator do processo, “a apreciação do TCU toma como base as evidências de que as contratações foram conduzidas em condições de desprestígio à competitividade, levando à formação de um cartel de empresas que distribuiu os contratos entre seus integrantes resultando na majoração de preços, enriquecimento ilícito e em atos de corrupção”, disse.

Inicialmente, conforme provas levantadas a partir de delações premiadas, acordos de leniência, acordos de cooperação firmados com empresas no âmbito judicial, documentação apreendida pela Polícia Federal e análises estatísticas, as fraudes se deram no chamado “Clube dos 9”. Após ampliação, foi formado o “Clube das 16” em que grandes empresas/grupos econômicos se associaram para dominar o mercado de grandes obras de engenharia civil demandadas pela Petrobras e para eliminar a concorrência real.

Diante da existência de muitas empreiteiras no “Clube das 16” e das dificuldades de se chegar a um acordo para todas as licitações, cinco empresas passaram a compor o “Clube VIP” de modo a terem prioridade nas maiores obras da Refinaria Abreu e Lima. Nestas licitações, as demais empresas do Clube formavam consórcios para oferecer propostas de cobertura.

Em uma das planilhas apreendidas pela Polícia Federal constavam nomes das empresas e respectivas obras da Refinaria em Pernambuco planejadas pelo cartel, posteriormente confirmadas nas contratações. O documento era anterior à aprovação da licitação pela diretoria da Petrobras, “indicando que as empreiteiras tinham conhecimento das licitações antes mesmo de seu anúncio ao mercado”, ressaltou Zymler.

Em licitações em que somente participavam empresas do Clube, saíram ganhadoras as de propostas com preços próximos ao limite superior da Petrobras. Enquanto as propostas das concorrentes estavam bem acima dos patamares. Por outro lado, nas licitações com outros participantes, uma das construtoras do Clube chegou a apresentar proposta com até 25% de desconto da estimativa da Petrobras. “Ou seja, segundo o estudo, houve a constatação do aumento de preços nas contratações quando presentes as empresas do ‘Clube’, indicando um prejuízo de R$ 1,9 bilhão somente nos contratos analisados, sem considerar os aditivos”, explicou o relator.

As contratações da Rnest foram feitas com licitações na modalidade convite, o que permitiu ao cartel acertar com os seguintes dirigentes da Petrobras quais empresas seriam convidadas: Paulo Roberto Costa, diretor de abastecimento; Renato de Souza Duque, diretor de engenharia; e Pedro José Barusco Filho, gerente executivo de engenharia. “Com essa modalidade afastava-se a hipótese de que o arranjo ilícito fracassasse em razão da participação no certame de empresa não envolvida no esquema”, afirmou Benjamin Zymler.

Para a implementação da conduta, era importante que os diretores da Petrobras recebessem previamente a lista das convidadas, mediante o pagamento de propina, que somaram R$ 404 milhões para esses contratos. As empresas convidadas já haviam combinado previamente quais seriam vencedoras e quais apresentariam propostas de cobertura.

Os diretores também provocaram a antecipação de cronograma da entrada em operação da refinaria, sem que os projetos básicos estivessem maduros, trazendo impactos em todo o andamento das obras, inclusive a necessidade de grande número de aditamentos contratuais.

Em relação às empreiteiras terem o poder de influenciar as esferas decisórias da Petrobras, observaram-se reajustes de preços por sugestão das licitantes bem acima do percentual usualmente praticado pela estatal. Isso teria provocado acréscimos relacionados à mão de obra de cerca de R$ 56 milhões, R$121 milhões, R$136 milhões e R$39 milhões em quatro dos cinco contratos.

Diante dos fatos, o TCU vai realizar a oitiva das empresas e dos dirigentes da Petrobras envolvidos para, caso sejam confirmadas as irregularidades, aplicar multas, inabilitar para exercer cargo público e declarar a inidoneidade para participar de licitações na Administração Pública Federal.

Os contratos também estão sendo objeto de tomada de contas especial para apuração do prejuízo aos cofres da Petrobras. Além disso, o TCU avaliará, em outros processos, as medidas adotadas pela estatal para prevenir, identificar e combater a fraude e a corrupção em licitações e contratos.

Nova metodologia de apuração de prejuízos

Para estimar o valor a ser ressarcido aos cofres públicos, o TCU realizou estudo econométrico para estimar o valor do dano causado ao erário por conta de atuação de cartel em licitações efetuadas pela Petrobras. Trata-se de técnica amplamente utilizada pelo sistema jurídico norte-americano e europeu.

Com essa metodologia o tribunal considerou como referência de preço documentos fiscais emitidos pelos fornecedores das contratadas, diferentemente do método usual, quando se buscam sistemas oficiais de referências de preços. Com isso, foi possível avaliar a economicidade dos preços praticados em itens em que dificilmente o TCU conseguiria levantar parâmetros de referência.

Segundo ministro Benjamin Zymler, “tendo em vista a solidez e precisão estatística do trabalho mencionado, além da possibilidade de dar um andamento mais célere aos processos, quando da instrução dos processos para apurar prejuízos resultantes do cartel, o TCU vai utilizar estudos econométricos para apurar os prejuízos nas hipóteses em que a utilização de outros métodos se mostre por demais onerosa e com poucas perspectivas de resultado confiável”, concluiu.