Vacinas republicanas
Valdecir Pascoal
O relógio dos tempos de pandemia parece caminhar mais lento. Às vezes, dá até a impressão de voltar no tempo, como atesta a bizantina discussão que envolve a sina-saga da vacina contra a Covid-19. Fé cega e línguas amoladas turvam ainda mais o falso dilema “liberdade versus responsabilidade social”. Enquanto isso, mesmo enxergando uma luz no fim da caverna, a segunda espada de Dâmocles continua a nos amedrontar.
Em meio a esse contexto de crises, esse domingo marca o término das eleições municipais e, a partir de janeiro de 21, teremos mais de 5 mil novos prefeitos (parte reeleitos). Diante desse cenário, aproveito para tratar de algumas vacinas, já testadas, que servem de profilaxia contra os resistentes e mutantes vírus da ineficiência e da malversação. São essas vacinas republicanas que vão permitir aos gestores enfrentar os graves problemas que mitigam a qualidade dos serviços públicos prestados aos cidadãos, desafios agravados pela pandemia.
A primeira delas é a estruturação de um Centro de Governo (CdG), formado por um sistema de planejamento, coordenação e de controle interno, por uma procuradoria jurídica e um órgão tributário estruturado. Essa vacina tríplice só será efetiva se produzida à base dos seguintes insumos: liderança, meritocracia e transparência. O CdG deverá interagir com todas as áreas da administração: educação, saúde, assistência, cultura, saneamento, meio ambiente, infraestrutura, zeladoria e ordenamento urbano. As políticas públicas só sairão do papel se ancoradas em estudos de prioridades e de cenários orçamentários, fiscais e econômicos e de seus riscos legais.
Outra vacina diz respeito à observância das orientações e decisões dos Tribunais de Contas. O gestor deve estar ciente de que, a despeito da função pedagógica desses Tribunais, as suas contas de governo, p. ex., não serão aprovadas caso descumpram regras como os limites constitucionais em saúde e educação; as normas de transparência e os limites de pessoal e dívida previstos na LRF; as obrigações previdenciárias ou as normas de tratamento dos resíduos sólidos. Lembrar também que uma rejeição de contas pode ter repercussão nas esferas penal, de improbidade, de inelegibilidade e social.
O bom uso dessas vacinas é possível, bastando, muitas vezes, mirar-se no exemplo de municípios já imunizados ao redor.
A última vacina é a da inovação: fazer diferente aquilo que não vem dando certo. Inovar no estilo Steve Jobs, começando por desacostumar e dizer não a muitas coisas. Eis o caminho que forja os estadistas.
Valdecir Pascoal – Conselheiro do TCE-PE